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Manchete no New York Times: “O mais divertido Show do Brasil pode estar no Congresso”

Manchete no New York Times: “O mais divertido Show do Brasil pode estar no Congresso”. Um dos espetáculos mais longos do Brasil, dispõe de uma variedade estonteante de personagens, cuja teatralidade aparecem em milhões de aparelhos de televisão, na maioria das noites.

O elenco, em constante mudança, de 594, inclui suspeitos acusados de assassinato e tráfico de drogas, ex-jogadores de futebol, um campeão de judô, uma estrela da música country e uma coleção de homens barbudos que adotaram papéis como líderes de um movimento de mulheres.

O elenco ainda inclui um palhaço que atende pelo nome de mal-humorado.

Mas estes não são atores. Eles são os homens e mulheres que servem na legislatura nacional.

A democracia pode ser um assunto mistificador e áspero, em qualquer lugar, mas o Congresso do Brasil, não tem igual.

Dilma Rousseff, presidente afastada do Brasil

Como a nação sofre sua pior agitação política em gerações, os legisladores que orquestram a deposição da presidente Dilma Rousseff – que foi suspensa na quinta-feira e enfrenta um processo de impeachment sob a acusação de manipular o orçamento – estão sob escrutínio renovado.

Mais da metade dos membros do Congresso enfrentam desafios legais, desde de casos em tribunais de auditoria envolvendo contratos públicos a acusações graves, como sequestro ou assassinato, de acordo com a Transparência Brasil, um grupo de acompanhamento da corrupção.

As figuras sob investigação incluem o presidente do Senado e do novo presidente do Congresso Nacional. Só neste mês, o presidente anterior, um evangélico comentarista de uma rádio cristã, que gosta de postar verso bíblico no Twitter, foi cassado do cargo, para ser julgado, sob a acusação de que ele, secretamente, possui US$ 40 milhões em subornos, em contas bancárias na Suíça.

Muitos dos problemas da legislação decorrem de recompensas generosas que podem ser encontradas no sistema partidário do Brasil, uma coleção imensa, de dezenas de organizações políticas, cujos nomes e agendas muitas vezes deixam os brasileiros coçando suas cabeças.

Há o Partido da Mulher Brasileira, por exemplo – um grupo cujos membros eleitos no Congresso são todos homens.

“O processo eleitoral permite muitas distorções”, disse Suêd Haidar, a fundadora e presidente do partido. Ela suspirou, reconhecendo que muitos dos homens que se juntam ao partido têm pouco interesse na promoção dos direitos das mulheres.

Um dos que se juntou ao partido, o senador Hélio José da Silva Lima, foi acusado de abusar sexualmente de uma sobrinha no ano passado, embora as acusações fossem retiradas mais tarde. “O que seria de nós, homens, se não houvessem mulheres, para ficar do nosso lado, para nos trazer alegria e prazer?”, disse à imprensa brasileira, quando questionado sobre a sua decisão de entrar no partido das mulheres.

A mesma fúria pública sobre a corrupção endêmica e má gestão governamental que ajudou a impulsionar a retirada de Dilma do poder, tem sido dirigida para os políticos, a maioria deles homens brancos, cuja propensão para ofertas de bastidores e auto-enriquecimento tornou-se parte do folclore brasileiro.

“A reputação da classe política no Brasil, realmente, não pode descer mais”, disse Timothy J. Power, um professor de estudos brasileiros na Universidade de Oxford.

“As pessoas comparam a legislatura a “House of Cards”, disse ele, referindo-se ao drama político da Netflix”, mas eu discordo. ‘House of Cards’ é na verdade mais verossímil.”

Com 28 partidos, o Congresso Nacional é o mais diverso e fraturado do mundo, segundo o Sr. Power. O vice-campeão, o Legislativo da Indonésia, tem um terço a menos de partidos.

“O Brasil não é atípico, é uma aberração”, disse Gregory Michener, diretor do programa de transparência pública da Fundação Getúlio Vargas, uma universidade no Rio de Janeiro.

Os partidos tendem a usar palavras como “democrática”, “cristão” e “republicano” em seus nomes, embora “Trabalho” tenha em quase todas. Entre eles estão o Partido Trabalhista do Brasil, o Partido Trabalhista Cristão, Partido Renovador Trabalhista Brasileiro e o Partido Nacional do Trabalho. Há também, o antes dominante, Partido dos Trabalhadores, de Dilma.

“O sistema inteiro é um monstro”, disse Juremir Machado da Silva, colunista do Correio do Povo, um jornal no sul do país, na cidade de Porto Alegre.

Uma pesquisa mostrou que mais de 70 por cento dos brasileiros não recorda a que partido pertence os candidatos que elegeram, e que dois terços do eleitorado não tem preferência por qualquer partidos.

Mais importante, dizem os especialistas, é que a maioria dos partidos não abraça nenhuma ideologia ou agenda e são simplesmente veículos de patrocínio e inclusão. Em um prazo típico de quatro anos, um em cada três legisladores federais vai mudar de partido, alguns mais de uma vez, de acordo com uma estatística de Marcus André Melo, um cientista político da Universidade Federal de Pernambuco.

Os legisladores brasileiros estão entre mais bem pagos do mundo, dizem os estudiosos, com salários generosos que vão bem além de seus salários mensais. Recebem, também, alojamento gratuito, cuidados de saúde e grandes equipes e goza de imunidade parlamentar. Somente o Supremo Tribunal Federal pode julgá-los por acusações criminais, um processo que pode levar anos.

“A única coisa que é melhor do que ser um partido político no Brasil é ser uma igreja”, disse Heni Ozi Cukier, cientista político na universidade E.S.P.M. em São Paulo. “Eles são oportunistas que estão à procura de algo que lhes dê poder, influência, proteção.”

Formar um partido requer a coleta de 500.000 assinaturas. O Sr. Cukier disse que 62 partidos estavam buscando reconhecimento oficial, incluindo um nome de um time de futebol.

Embora o presidente do Brasil lidere um dos maiores países do mundo, ele ou ela deve forjar coalizões com até uma dúzia de partidos, para ter a legislação aprovada no Congresso. O preço da lealdade é, muitas vezes, um posto ministerial, ou três, dependendo do número de votos que o partido pode oferecer.

Em alguns casos, a cooperação envolve a troca de dinheiro ilícito. Em 2005, um escândalo conhecido como mensalão, revelou a difusão de tais arranjos. Para ganhar votos no Congresso, o partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mentor de Dilma e o porta-estandarte do Partido dos Trabalhadores, pagava aos legisladores aliados uma bolsa mensal de US $ 12.000.

O mais recente escândalo – conhecido como Operação Lava Jato, ou Operação Car Wash – revelou-se ainda maior, com bilhões de dólares em subornos dirigidos aos partidos políticos da companhia nacional de petróleo, a Petrobras. Mais de 200 pessoas, de magnatas de negócios a líderes partidários, estão implicados no escândalo, e espera-se que seus números venham crescer.

A fúria pública sobre o esquema, desempenhou um papel fundamental na derrubada de Dilma, que foi presidente da Petrobras, quando o arranjo das propinas foi idealizado, embora ela não tenha sido acusada de qualquer delito. Em seu processo de impeachment, ela é acusada de um truque orçamental num esforço para esconder problemas econômicos do Brasil para vencer a reeleição em 2014 – e não de roubar para enriquecer a si mesma.

A necessidade de formar alianças de conveniência no Congresso pode levar ao caos legislativo, especialmente quando os parceiros descontentes apertam a coalizão da presidente Dilma, que teve, uma vez, uma ampla maioria na Câmara, foi finalmente abatida pelo, agora deposto, presidente da casa, Eduardo Cunha, um ex-aliado que enfrenta um julgamento.

O partido do Sr. Cunha, Partido do Movimento Democrático Brasileiro, o chamado P.M.D.B., tornou-se uma fonte particular de indignação no Brasil. Críticos dizem que o partido, fundada há cinco décadas como um partido de oposição, mas tolerado pelo governo militar do país, tornou-se um vasto local de apadrinhamento para os seus membros, que abraçam um amplo espectro de ideologias.

O trunfo do partido é o seu tamanho, o que significa que os presidentes têm que entrar em uma parceria, que envolve distribuição de cargos no gabinete cobiçados. Dilma escolheu Michel Temer do P.M.D.B. para ser seu vice-presidente. Este ano, ele se virou contra ela e retirou seu partido da sua coalizão, abrindo caminho para o julgamento de impeachment de Dilma. O Sr. Temer, que foi condenado por violar os limites de financiamento de campanha, é agora presidente da nação.

A reforma política pode ser um desafio, dado que os legisladores devem aprovar desfazer o sistema que os protege. Houve algumas mudanças, incluindo uma lei recente que proíbe candidatos com antecedentes criminais de concorrer à presidência por oito anos, e uma lei de financiamento de campanha, prevista para entrar em vigor este ano, que limita a influência do dinheiro corporativo.

Membro do Congresso Nacional do Brasil, um ex-palhaço conhecido como o deputado Tiririca, foi felicitado no mês passado depois de votar para aprovar o impeachment do presidente Rousseff. Crédito Ueslei Marcelino / Reuters

O esmagamento dos partidos brasileiros tende a favorecer os candidatos de celebridades, cujo reconhecimento do nome os ajuda a catapultar para o topo das urnas durante as eleições. O exemplo mais curioso é Tiririca, o Palhaço, cujo nome artístico traduz como mal-humorado.

Em 2010, ele concorreu ao Congresso com o slogan “Não pode ficar pior”, e seu material de campanha incluiu este slogan: “O que faz um deputado? A verdade é que eu não sei, mas vote em mim e eu vou te dizer. ”

Ele ganhou com mais de 1,3 milhões de votos – quase o dobro do próximo candidato.

Em uma entrevista, Tiririca – cujo verdadeiro nome é Francisco Everardo Oliveira Silva, embora Deputado Tiririca seja seu nome no site do Congresso – disse que muitas vezes ficou decepcionado com a desordem no Congresso.

“No início, era uma piada”, disse ele de sua candidatura. “Então eu decidi que, se tantas pessoas acreditam em mim, eu teria que dar o meu melhor, e é isso que estou fazendo.”

 

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