Ricardo Tamura: Tenor brasileiro que vive na Alemanha, conta como venceu a morte
Ricardo Tamura conta como foi escapar da morte. Numa postagem no seu perfil do Facebook no dia 6 de outubro de 2018, o tenor brasileiro radicado na Alemanha conta como foi ter sofrido um grave problema de saúde, que mudou completamente a sua vida. Considerado um dos cantores líricos brasileiros mais importantes da atualidade e de fama mundial, Ricardo teve um AVC (acidente vascular cerebral), que causou alguns danos, entre eles afetando a sua visão. Confiram abaixo o seu relato:
Há exatamente um ano atrás, eu estava planejando viajar de carro para Düsseldorf, a fim de pegar um vôo de lá para Tóquio…
Como era normal para mim naquela época, eu fiquei acordado até muito tarde, e fui tomar banho por volta das 4 da manhã, antes de ir me deitar por apenas algumas horas…
Mais tarde, de uma enfermeira que me perguntava, num quarto de hospital, estranho, escuro e desconfortável, se eu estava me sentindo bem…
Lembro-me de ter pedido um copo de água, e de ouvir que não podia beber água…
Quando perguntei por quê, a resposta foi “Porque você está com uma hemorragia enorme, dentro da cabeça”!…
(Esta foto de MRT foi tirada em Janeiro, mais de três meses após o AVC.
A hemorragia ainda pode ser claramente vista, e ainda era bem grande!)
O que eu não sabia: os médicos, fora do quarto, estavam dizendo à minha esposa que eu tinha sofrido uma enorme hemorragia intracranial, e que as minhas chances de sobreviver eram poucas… E, mesmo que eu pudesse milagrosamente sobreviver, eu, provavelmente, iria me tornar totalmente incapacitado, dada a extensão da hemorragia…
Eu, que ainda não sabia disso, “teimosamente” acordei, no dia seguinte, conseguindo me movimentar e falar normalmente (em cinco idiomas!), apesar de sentir minha visão um pouco estranha…
Eu conseguia até me lembrar do texto completo da ópera “Tannhäuser”, de Wagner (!), e de muitos poemas que eu tinha aprendido nos tempos de escola!!!
E, como tenores geralmente são: quando a voz funciona bem, eles não param de cantar!
A minha voz estava funcionando melhor do que nunca, e, por isso, continuei cantando por várias horas, até eu ter a “ATENÇÃO” de toda a inteira ala do hospital! (Educadamente, ninguém me mandou “calar a boca”, mas, em vez disso, disseram que ”estavam gostando muito, e que eu deveria, ”por favor, continuar cantando “… (Nunca tive a oportunidade de agradecer aos médicos e enfermeiros da “Stroke Unit” da Südklinikum Nuremberg por tudo o que fizeram por mim…)
Eu tinha perdido uma grande porção do meu campo visual, do lado esquerdo, mas, ao longo das semanas seguintes, também este problema ficou menor! (e atualmente é muito pequeno!).
Assim, eu pude participar de um concerto beneficente para o Unicef depois de apenas oito semanas, e, duas semanas depois disto, cantei uma performance inteira de “Tosca” (em forma de concerto). Dois meses depois da ” Tosca “, já fui capaz de substituir, de última hora, um colega doente, em uma apresentação encenada de ” Carmen“ em Nuremberg, incluíndo todas as cenas de lutas!
Neste momento – como um milagre – muitos dos meus amigos mais próximos começaram, espontaneamente, a me ajudar, em diferentes maneiras! Com aquela ajuda – junto com alguma ajuda financeira de minha mãe e dos poucos cachês de das apresentações que fui fazendo – eu consegui sobreviver até agora!
A demonstração de solidariedade e de amizade que eu presenciei não foi só avassaladora, mas foi provavelmente o presente mais maravilhoso que eu já recebi!
Aquele “novo eu” completou um ano de idade!
Registro, mais uma vez, meu agradecimento a todos os que transformaram uma quase “tragédia” em um dos períodos mais extraordinários de minha vida!!!
Para aqueles que tiverem maior interesse, aqui alguns detalhes a mais sobre meu estado atual:
Imagine aqueles momentos em que você está concentrado em algo, ou que está se divertindo muito: Nesses momentos, você se sente totalmente imerso na situação, e muito próximo do mundo à sua volta!
O meu estado atual pode ser aproximadamente descrito, dizendo que ele oscila, constantemente, entre esses dois extremos…
Nos ” dias piores “, a sensação de que eu estou “distante” do mundo é muito forte: Eu sinto como se estivesse vendo tudo através de uma “barreira”… É uma sensação muito desagradável e bastante ” assustadora“…
E, cada vez que tenho a sensação de ”estar prestes a desmaiar“, meu cérebro gera um sinal de ”alarme” de que, talvez, um novo AVC esteja prestes a acontecer…
Eu agora aprendi a não mais “entrar em pânico”, mas os primeiros meses foram muito difíceis….
Apesar de ainda haver várias ”semanas ruins “, os ”bons” dias parecem estar predominando cada vez mais.
Mas os médicos nunca encontraram o que especificamente causou o AVC, e portanto, não há, aparentemente, nada que garanta que ele não possa acontecer de novo…
Além de reduzir o stress e controlar a pressão arterial, não há nada mais que possa ser feito, exceto “esperar que não volte a acontecer”!
Claro, isto me deixa cheio de inseguranças: Por vezes, predomina a sensação de que eu ganhei uma “nova vida”, e eu me sinto totalmente “radiante”!…
Outras vezes, eu me pergunto se, em vez de “outra vida”, eu não ganhei apenas uma “prorrogação” da vida que tinha, e que, possivelmente, um novo problema volte a acontecer, em breve, e termine com tudo!
Ninguém sabe quanto tempo ainda irá viver, e nem como será o próprio futuro!…
Assim, eu preciso apenas viver dia após dia, como qualquer outra pessoa faz!
Os profundos sentimentos de gratidão que adquiri em relação à vida, porém, tornam estas questões bastante irrelevantes!
Assim, fica apenas meu desejo de que cada um de vocês, leitores, saiba como apreciar e aproveitar ao máximo cada momento de suas vidas!.. Porque tudo pode acabar muito rápido, e sem nenhum aviso prévio!
Em Outubro, realizará um concerto na cidade onde reside, em Nuremberg -Alemanha, com o “Stabat Mater” de Dvorak. A seguir realizará quatro concertos para a UNICEF, em Novembro/Dezembro. Em Dezembro, começa a ensaiar sua primeira produção completa, desde o AVC, que irá estrear em Janeiro, no Teatro onde começou a sua carreira na Alemanha (Osnabrück). Ricardo disse que se tudo correr bem até lá, continuará aumentando as suas atividades, inclusive com participações internacionais fora da Europa. Mas. por enquanto, ainda precisa ter cautela em fazer vôos de longa distância…
Descendente de família japonesa e síria, Ricardo Tamura é natural de São Paulo.
Obs: As fotos exibidas aqui são de trabalhos do tenor Ricardo Tamura e são meramente ilustrativas, sem conexão com o texto, com exceção da imagem de MRT.
Da Redação by Cleo Oshiro
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